Presos nas consequências -- Estados do Oriente Médio pós-guerra lutam por recomeço-Xinhua

Presos nas consequências -- Estados do Oriente Médio pós-guerra lutam por recomeço

2025-12-27 11:27:21丨portuguese.xinhuanet.com

Parapente se apresenta em um desfile militar marcando o primeiro aniversário da transição política da Síria em Damasco, Síria, em 8 de dezembro de 2025. (Foto por Ammar Safarjalani/Xinhua)

Cairo, 25 dez (Xinhua) – Conforme 2025 chega ao fim, um trio de países do Oriente Médio se encontra em um interlúdio familiar: as batalhas mais barulhentas diminuíram, mas a luta pelo poder, e em nome de quem, continua.

Esses países, Líbano, Síria e Iraque, enfrentam a mesma questão crucial: conseguirão alcançar um recomeço significativo, um que restaure a soberania, consolide a autoridade estatal e trace um caminho independente para o futuro?

ATORES ARMADOS X AUTORIDADE ESTATAL

Uma característica comum aos três países é a relação tensa entre as instituições estatais e os atores armados, cujo poder foi forjado durante o conflito e se mostrou resistente à centralização.

No Líbano, as tentativas do governo de desarmar o Hezbollah, o poderoso partido político e grupo militante xiita apoiado pelo Irã, têm sido lentas e complexas.

Foto tirada em 23 de novembro de 2025 mostra apartamento residencial danificado por ataque aéreo israelense em Haret Hreik, subúrbio ao sul de Beirute, Líbano. (Xinhua/Bilal Jawich)

Sob um acordo de cessar-fogo com Israel, Beirute se comprometeu a livrar as áreas ao sul do rio Litani de armas ilegais e a mobilizar o Exército Libanês para lá. Apesar disso, o Hezbollah continua rejeitando o desarmamento, argumentando que suas armas permanecem necessárias enquanto Israel representar uma ameaça.

O analista político libanês, George Alam, disse que a pressão do governo para desarmar o Hezbollah reflete uma tentativa de acabar com a coexistência com um "mini-estado", uma situação que ele descreveu como incompatível com a restauração da soberania do Líbano.

O comandante do Exército Libanês, general Rodolphe Haykal, indicou que o caminho preferível seria o diplomático, em vez do confronto. No entanto, Alam argumentou que o diálogo fracassou porque o conflito está fundamentalmente inserido em uma luta regional e internacional mais ampla.

Na Síria, mais de 13 anos de conflito armado deixaram o país fragmentado e controlado por facções rivais. O novo governo, que assumiu o poder há um ano, prometeu integrar os grupos armados em um comando unificado. Contudo, a violência em Latakia, na zona rural de Damasco e em Sweida revelou que essa visão ainda está muito longe da realidade.

Um agente da Segurança Interna patrulha em Aleppo, Síria, em 7 de outubro de 2025. (Str/Xinhua)

As Forças Democráticas da Síria (SDF, na sigla em inglês), consideradas a maior força armada não estatal na Síria, assinaram um acordo com o governo interino em março, prometendo integração, mas a implementação permanece paralisada.

O jornalista curdo, Baz Baqari, disse ao portal de notícias on-line Ultra Syria que estabelecer um acordo tão abrangente com um prazo fixo de nove meses era prematuro, dados os interesses regionais e internacionais sobrepostos da Síria.

O analista político sírio, Firas Allawi, também observou que a presença de armas nas mãos de indivíduos fora do controle do Estado e a falta de controle estatal pleno sobre partes do território sírio contribuem para a vulnerabilidade da segurança da Síria.

No Iraque, embora muitos grupos armados tenham sido formalmente incorporados às Forças de Mobilização Popular (FMP), vários deles continuam mantendo autonomia na tomada de decisões, operando em paralelo com o governo central, em vez de subordinados a ele.

A prova disso são os frequentes ataques de grupos alinhados às Forças de Mobilização Popular (PMF, na sigla em inglês) contra as forças americanas no Iraque e na Síria, que provocam respostas militares e transformam o país em um campo de batalha para acertos de contas.

Ali Mousa, analista político do Centro al-Rafid para Estudos de Mídia e Estratégia do Iraque, disse que o governo iraquiano parece estar "caminhando em um campo minado", buscando um equilíbrio entre as facções apoiadas por países da região e a pressão dos EUA pelo desarmamento.

Homem observa cartaz de campanha das próximas eleições parlamentares do Iraque em Bagdá, Iraque, em 3 de novembro de 2025. (Xinhua/Khalil Dawood)

INTERVENÇÃO EXTERNA X AUTOSSUFICIÊNCIA

Mesmo onde existe vontade política para consolidar a autoridade estatal, as potências externas que operam por meio de atores locais restringem severamente a capacidade dessas nações de trilhar caminhos independentes.

No Líbano, as negociações de desarmamento envolvendo autoridades americanas, francesas e sauditas destacam o grau em que a política de segurança se tornou mediada internacionalmente. "Atualmente o Líbano é palco de uma intensa ‘disputa de poder’ entre o Irã, de um lado, e Israel e os Estados Unidos, do outro. Enquanto essa situação não mudar, o Líbano não terá plena soberania", disse Alam.

Pessoas observam um complexo de fabricação de cimento destruído após ataques aéreos israelenses em Ansar, Líbano, em 17 de outubro de 2025. (Foto por Ali Hashisho/Xinhua)

Na Síria, desde a deposição do ex-presidente Bashar al-Assad no final de 2024, as milícias que se tornaram autoridades interinas lutam para estabelecer a estabilidade, dependendo fortemente do apoio externo.

A Turquia expandiu sua influência apoiando as instituições de Damasco, assegurando suas fronteiras e fornecendo ajuda humanitária. Israel, por sua vez, intensificou as operações militares e se posicionou como um ator estratégico no cenário pós-Assad.

"A Síria é uma terra de interesses conflitantes para a Turquia e Israel, que mantêm presença militar no país por diferentes razões", disse à Xinhua, Batu Coskun, pesquisador não residente da Trends Research and Advisory, com sede nos Emirados Árabes Unidos.

"A competição surgiu claramente na Síria", disse Oytun Orhan, pesquisador sênior do Centro de Estudos do Oriente Médio, com sede em Ancara. "Essas prioridades sobrepostas inevitavelmente levam a atritos, particularmente em meio às consequências diplomáticas da crise em Gaza".

Foto tirada com celular mostra interior de uma casa destruída após ataques aéreos israelenses em Beit Jinn, na Síria, em 28 de novembro de 2025. (Str/Xinhua)

No Iraque, essa dinâmica se reflete no delicado equilíbrio que Bagdá busca entre cooperar com os Estados Unidos em segurança e reconstrução e acomodar grupos alinhados ao Irã, cuja influência política e capacidade militar permanecem significativas.

Yasir Mutlaq, chefe da Fundação Fawasil para Pesquisa e Estudos do Iraque, disse que esse delicado equilíbrio visa garantir a estabilidade interna e evitar que o país seja arrastado para uma luta mais ampla por influência.

Com o Iraque entrando no que pode ser um processo de formação de governo que durará meses, após as eleições parlamentares do mês passado, analistas voltaram a destacar o papel decisivo das influências externas. "Seja o período de espera por um novo governo longo ou curto, seja ele aprovado ou rejeitado pelo povo, o governo não nascerá sem a bênção de Washington e Teerã", disse Mousa.

Na visão do escritor e analista libanês Samir Mansour, Líbano, Síria e Iraque estão adotando uma política externa preventiva, buscando evitar e mitigar riscos por meio de posições moderadas e centristas. Contudo, ele alertou que essas abordagens oferecem pouca proteção real quando as potências dominantes impõem obrigações e rejeitam a neutralidade.

Quanto ao caminho a seguir, Mousa sugeriu que os países da região coordenem suas posições e cooperem por meio de organismos multilaterais e regionais, incluindo as Nações Unidas, a Liga Árabe e a Organização de Cooperação Islâmica, adotando posturas unificadas para contrapor ações unilaterais e soluções militares.

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