Redução da Pobreza é a síntese da meta centenária de 2020

2017-03-28 10:41:20丨portuguese.xinhuanet.com

Por Evandro Menezes de Carvalho (高文勇)

O mais importante evento político anual da China – as “Duas Sessões” – atraiu a atenção de observadores estrangeiros. Afinal, sendo a China a segunda maior economia mundial, decisões domésticas podem ter repercussões na economia de outros países.

Inúmeros temas e projetos de lei foram propostos e debatidos durante as sessões da 12a Assembleia Popular Nacional (APN) e do 12o Comitê Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPC). Mas o tema da redução da pobreza merece uma atenção especial. Afinal, ele é o indicador principal de que as políticas adotadas pelo governo em diversas áreas estão tendo um impacto positivo sobre o conjunto da população, e não apenas sobre uma parcela dela.

A China tem feito avanços extraordinários em sua economia que possibilitaram a retirada de milhões de pessoas da linha de pobreza. Mas a tarefa ainda não está concluída. A certeza de que o governo está comprometido com esta agenda decorre do fato de que ela está diretamente relacionada à primeira meta centenária de 2020 que prevê tornar a China um país moderadamente próspero em todos os sentidos. Há um parâmetro econômico claro estabelecido pelo governo: o PIB per capita de 2020 deve ser o dobro daquele registrado no ano de 2010. O desafio foi lançado.

Medidas já tomadas pelo governo central buscam criar as condições para aliviar a pobreza nas regiões empobrecidas do país. São exemplos os projetos-piloto de comércio eletrônico estabelecidos em mais de 400 municípios empobrecidos e a criação de programas de desenvolvimento do turismo em mais de 20.000 aldeias. O governo quer estimular o empreendedorismo que gera renda e emprego.

Vale notar que a crescente urbanização do país é um aliado importante no combate à pobreza. Conforme afirmou o Primeiro-Ministro Li Keqiang, nos últimos quatro anos a China criou, anualmente, mais de 13 milhões de novos empregos urbanos. A meta para 2017 é de criar 11 milhões de empregos. O desafio, contudo, é evitar que o processo de urbanização seja feito à revelia das áreas rurais, aumentando a desigualdade entre o campo e a cidade.

O governo tem, ainda, o desafio de criar oportunidades de emprego para os trabalhadores que estão sendo despedidos em razão dos esforços para reduzir o excesso de capacidade. Neste processo de adaptação dos trabalhadores para uma nova realidade, e com o intuito de evitar o aumento de desempregados sem condições de voltar ao mercado de trabalho, torna-se imprescindível uma política de assistência governamental que auxilie o trabalhador a adquirir novas habilidades e competências.

Por fim, é preciso investir em educação a fim de preparar os jovens para esta nova realidade e evitar que eles engrossem as estatísticas dos desempregados. A sociedade chinesa é consciente da importância da educação. Durante as Duas Sessões, discutiu-se se o governo deveria estender o ensino obrigatório para além dos nove anos atualmente exigidos. É um debate que revela, ao menos, que a etapa da popularização do ensino obrigatório já foi superada na China. E se, de um lado, há uma preocupação em garantir uma boa formação básica para todos; de outro, há o objetivo de ter um ensino universitário apto para a nova economia, as mudanças que a tecnologia já está promovendo nas profissões e à altura da presença internacional da China.

O desafio do governo é avançar rumo à concretização da meta centenária sem deixar ninguém para trás. Mas para ser bem sucedido neste propósito – sobretudo no contexto da “nova normalidade” com crescimento do PIB em torno de 6,5% - o governo terá que, necessariamente, contar também com o esforço da sociedade chinesa. É por isto que, sabiamente, o Presidente Xi Jinping pediu, em seu discurso de Ano Novo, que a nação “arregace as mangas e trabalhe mais”. Isto se resume na famosa frase: no pain, no gain. Ou seja, sem sacrifício, não há ganhos.

Mas ao contrário do que esta frase poderia supor aos olhos de um ocidental, a China tem uma visão de desenvolvimento que não é baseada no individualismo exacerbado sem qualquer consideração com a dimensão social da vida. O governo chinês entende que a eliminação da pobreza tem de ser um compromisso de toda a sociedade chinesa. Em outras palavras, o esforço tem que ser de todos para que todos possam usufruir dos benefícios. Esta é a síntese de um desenvolvimento socialmente integrado que talvez revele muito do que é a democracia socialista chinesa em comparação com as democracias ocidentais onde a pobreza e a desigualdade só aumentam.

*Evandro Menezes de Carvalho é Professor de direito internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio de Janeiro (Brasil).

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